4W6GH – Timor-Leste (OC-148)

Cheguei a Timor-Leste a 7 de Fevereiro de 2000. Algumas semanas depois, com o valioso apoio do José de Sá (CT1EEB), tentei obter a licença para operar a partir de 4W. Aproveitei este curto período para preparar a estação em Dili. A 22 de Março a minha licença foi atribuída. No dia seguinte, o José de Sá telefonou para Dili a dar a boa notícia. Nesse mesmo dia comecei a transmitir. O primeiro QSO como 4W6GH foi obviamente com o José de Sá às 14H33 (hora local) em 21 MHz e até à meia-noite daquele dia fiz cerca de três mil QSO’s – um pillup inesquecível. A experiência é única, meio-mundo chama em simultâneo, o s-Meter marca 40dB acima de 9, é necessário estar no lugar para sentir.

A operação tinha começado e o objectivo era dar a oportunidade ao maior número possível de rádio-amadores para contactarem com Timor-Leste, sem dar preferência a este ou aquele país.

Inicialmente comecei por operar em 10/12/15/17/20 metros em SSB. Devo referir que, para chegar à Europa a melhor banda foi a de 21MHz pelas 17H00 locais. Prova disso é o meu QSO diário com Tina (CT1YSX), minha XYL.

Em Dili, apenas utilizei dois dipolos invertidos em ‘V’, um para 10/15/20 e outro para 12/17 metros e um Yaesu FT-890 (com 100W PEP).

No final de Março encontro-me com o José de Sá (CT1EEB agora 4W6EB) em Dili. Alguns dias mais tarde fui movimentado para Liquiçá, a cerca de 30Km de Dili.

Esta mudança para Liquiça implicou uma semana sem actividade no rádio. Foi necessário improvisar novos mastros e preparar as instalações para começar a transmitir novamente. Alguns dias mais tarde já estava operacional nas bandas WARC e nas bandas de 40/80/160 metros.

Em Liquiça tive oportunidade de fazer os primeiro QSO’s nas bandas de 40/80/160 metros. Não existiam grandes limitações de espaço e o bambu tornou-se a matéria-prima de eleição para fazer os mastros (apenas utilizei antenas de fio). Para os 160 metros utilizei uma ‘L’ deitada, cortada para meia onda, elevada a 12 metros e com uns generosos 300 metros em radiais enterrados a cerca de 10cm. Dediquei mais tempo ao RTTY onde fiz cerca de cinco mil QSO’s.

No satélite RS-12/13 apenas um QSO com o Bernhard Dobler (DJ5MN). Escutava muito bem as estações europeias (fora do footprint) quando o satélite estava na zona do Alasca (KL7), ou entre Madagáscar (8R) e a Índia (VU).

A grande dificuldade com a Europa estava na faixa de 40 e 80 metros, pois estava a transmitir apenas com 100W, o mesmo não acontecia com a América do Norte, onde facilmente fazia bons QSO’s.

Foi em Liquiça que o meu camarada António Alves começou a se interessar pela rádio e a passar mais tempo perto de mim enquanto eu comunicava com os radioamadores de todo o mundo, mais tarde, acompanhou-me na expedição à Ilha de Ataúro (OC- 232).

De 23 de Março a 5 de Agosto de 2000 fiz cerca de cinquenta mil QSO’s distribuídos por 197 países. Por continentes, 50% dos QSO’s foram com a Europa, 29% com a Ásia, 18% com a América do Norte e 2% com a Oceania. O restante 1% dos QSO’s foi para a África, Antárctica e América do Sul. Por modos, 90% em SSB e 9% em RTTY. O restante 1% dos QSO’s foram em CW, FM e Satélite.

A minha operação em Timor-Leste não teve qualquer tipo de patrocínios. O meu muito obrigado a todos aqueles que me apoiaram e deram a sua preciosa contribuição para o sucesso desta operação. Entre eles, a minha XYL Ana Cristina (CT1YSX), o José de Sá (CT1EEB), o Júlio Mateiro (CT1ZW), o António Callixto (LX2DW) e o Joaquim Dias (CT4KO). Quero também agradecer a sempre agradável companhia do Javier Adanero (EA1AUS), do Masaru Hanazaki (JA5AQC), do Domenico Appendino (I1APQ), do Arai Morio (JA1OYY) e do meu camarada António Alves.


4W6GH/p – Ilha de Ataúro (OC-232)

No início era só uma ideia, quase impossível, dadas as dificuldades existentes em Timor-Leste. O transporte foi o primeiro obstáculo encontrado, depois de várias tentativas, encontramos um pescador que se dispunha a transportar-nos para a ilha por um milhão de Rupias. Depois o gerador, coisa rara e cara em Timor-Leste, mas necessária para a operação, não existe energia eléctrica em Ataúro.

Graças à valiosa colaboração do Esquadrão 552 (Zangões), da Força Aérea Portuguesa obtivemos um gerador para a expedição. Depois de todos esses contratempos, sem qualquer tipo de suporte, com todo o tipo de limitações que se possa imaginar, mas com muita vontade e determinação, chegou a hora de ver confirmada a nossa partida para Ataúro.

O nosso destino era a aldeia de Maker, a 55 milhas náuticas de Liquiçá.

A carga estava pronta. Um gerador de 1,2 KVA, quatrocentos litros de gasolina, água e alimentos para quase um mês, mochilas, sacos de dormir, um toldo para servir de abrigo, um mastro telescópico com dez metros de comprimento, um dipolo multi-banda, vinte e cinco metros de cabo coaxial e um Yaesu FT-890. A equipe era formada por quatro elementos. Ao Rogério Machado foi confiada a nossa alimentação e o nosso dispositivo de segurança, o Francisco Pinto tinha por missão preparar a instalação eléctrica e manter o gerador operacional, o António Alves foi encarregado de recolher imagens para documentar a expedição e zelar pela minha segurança durante a noite. A minha única missão era fazer rádio. Das quarenta e uma horas de permanência na ilha trinta e duas foram a fazer rádio.

No fim da tarde de seis de Julho estava tudo confirmado, partíamos na tarde seguinte conforme planeado.

Cerca das 14H00 locais, chegamos à Baía de Tibar, de onde uma pequena embarcação de seis metros nos levaria até à ilha. Carregado todo o material, iniciámos uma viagem de três horas com mar muito agitado. Às 17H00 locais chegamos à praia da aldeia de Maker (8º31’45″S 125º31’5″E), o nosso ponto de destino.

A ilha tem cinco divisões administrativas, são eles o Suco Beloi (com 1240 habitantes), o Suco Vila (com 1220 habitantes), o Suco Maquili (com 1845 habitantes), o Suco Biqueli (com 1836 habitantes) e o Suco Macade (com 1815 habitantes). A nossa estadia foi na aldeia de Maker no Suco Beloi, esta aldeia tem cerca de 490 habitantes que vivem essencialmente da pesca. O chefe da aldeia era o Sr. Alberto Soares que tinha como secretário o Sr. Carlos de Araújo.

A recepção não podia ser mais calorosa. Assim que desembarcámos na praia, o chefe da aldeia veio dar as boas vindas ao grupo. Foi então que lhe dei a conhecer o motivo da nossa ida para a ilha e lhe pedi autorização para montar o acampamento na praia. Foi então que o Sr. Alberto Soares sugeriu que ficássemos na escola que estava abandonada. Foi uma oferta inesperada que não podíamos recusar. Depois de nos mostrar a casa (completamente degradada), começamos a descarregar a embarcação. O entusiasmo era visível habitantes, todos queriam colaborar connosco.

O dia solar estava a acabar e ainda faltava preparar a estação. Um dipolo para 14/21/28 MHz em ‘V’ invertido e um Yaesu FT-890 era tudo o que dispunha para fazer da primeira expedição a esta nova referência IOTA um sucesso.

Pouco depois estava no ar, ás 11H50z fiz a primeira chamada geral em 21,260 MHz à qual respondeu imediatamente o Radek Stolfa (OK1FHI) com sinais excelentes.

Cerca de 13H30z fui contactado pelo Roger Balister (G3KMA), estava a operar à 90 minutos e tinha realizado 216 QSO’s, deu-me a referência OC-232/p, a primeira parte do objectivo estava alcançada, Ataúro era um candidato a ‘new one’ no programa IOTA e eu estava lá.

Durante sete horas fiquei nos 21 MHz, com bons sinais da Europa e da Ásia, de tempos em tempos apareciam estações da América do Norte. As estações de japoneses chegavam com sinais muito fortes. As primeiras dez horas de actividade em Ataúro foram completamente ininterruptas.

O cansaço era proporcional ao entusiasmo, precisava de dormir, a noite tinha sido longa e cansativa, o sol já estava alto, a minha equipe estava acordada e tinha preparado o café da manhã. Depois de dormir um pouco, aproveitei para mergulhar nas águas cristalinas da ilha, mais tarde, encontrei-me com um grupo de habitantes da aldeia. Só nesse momento pude verificar as suas condições de vida precárias. A população era muito jovem e a mortalidade infantil muito alta. Segundo os habitantes, não há transportes na ilha e apenas existe um posto médico a seis horas de distância, a pé, porque na ilha não existem carros. Dadas as escassas condições de higiene, grande parte dos habitantes sofre de doenças cutâneas, as crianças eram as mais atingidas.

Às 07H30z recomecei a actividade em 21MHz a contactar quase exclusivamente estações japonesas. Fiz várias centenas de QSO’s com o Japão até às 13H00z quando as primeiras estações portuguesas começaram a aparecer. Mais tarde, fomos convidados pelos marinheiros da nossa embarcação, com uma refeição de lagostas capturadas por eles durante a noite. Depois das 13H00z os sinais da Europa superaram os demais. Continuei nos 21MHz até às 18H40z com bons sinais da Europa. O dia de sábado terminou com dezoito horas de actividade.

O último dia no rádio começou há cerca de 05H00z em 28MHz, mas a banda logo se revelou com pouca actividade, apenas alguns JA’s e W’s. Regressei aos 21MHz e lá permaneci até às 15H00z, passei então aos 14MHz, mais tarde encerrei a expedição com um QSO com o Dr. Klaus Owenier (DJ4AX), a última estação contactada. Treze horas e meia de rádio neste último dia.

A expedição terminou, 41 horas de permanência na ilha, 5,691 QSO em 32 horas úteis de funcionamento. Era tempo de organizar a nossa bagagem, receber a declaração escrita pelo secretário da aldeia a comprovar a nossa permanência na ilha e de agradecer aos nossos amigos a generosa hospitalidade.

Um agradecimento especial para o apoio a esta operação vai para António Alves, Francisco Afonso, Francisco Pinto, Januário de Oliveira, José de Sá, José Reis, Júlio Mateiro, Rogério Machado e para a Força Aérea Portuguesa.